Em recente decisão, a 16ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) entendeu que não cabe à instituição financeira a responsabilidade por prejuízos sofridos por um consumidor vítima de golpe ao tentar adquirir um veículo anunciado em ambiente virtual.
De acordo com os autos, o autor da ação efetuou uma transferência bancária para pagamento de um veículo anunciado em marketplace, acreditando tratar-se de um negócio legítimo. Ocorre que, após a concretização da transferência, não obteve mais retorno do suposto vendedor, evidenciando tratar-se de fraude.
Ao analisar o recurso interposto pela instituição financeira intermediadora do pagamento, o relator, desembargador Carlos Eduardo Borges Fantacini, entendeu que a conduta fraudulenta foi praticada exclusivamente por terceiro estelionatário, aliada à imprudência e à inexperiência do autor e sem qualquer participação ou falha atribuível à instituição financeira.
Assim, de acordo com o TJSP, no julgamento da Apelação Cível nº 1015702-34.2023.8.26.0625, não houve defeito na prestação do serviço por parte do banco, eis que o prejuízo do consumidor não decorreu da insegurança do sistema disponibilizado pela instituição financeira, mas sim por fato imputável exclusivamente ao autor da ação e a terceiros.
A responsabilidade das instituições financeiras em marketplaces:
A responsabilidade civil das instituições financeiras segue, em geral, a sistemática do artigo 14 do CDC, ou seja, os fornecedores respondem independentemente da existência de culpa (responsabilidade objetiva), pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação de seus serviços.
Entretanto, para que se configure o dever de indenizar, é necessário que estejam presentes os elementos clássicos da responsabilidade civil, isto é, além da existência do dano suportado pelo consumidor, o nexo de causalidade entre o seu prejuízo e a falha no serviço prestado pelo fornecedor.
No caso de fraudes praticadas por terceiros, como é o caso recentemente analisado pelo TJSP, como golpes de anúncios falsos em marketplaces, a jurisprudência tem exigido do consumidor a demonstração de que houve, por parte do banco, alguma conduta omissiva ou comissiva que tenha facilitado ou contribuído para o resultado danoso.
Nesse contexto, a simples abertura de conta em nome do fraudador, por si só, não configura, necessariamente, falha no serviço bancário. Isso porque a abertura de contas obedece a normas regulatórias do Banco Central, inclusive quanto à identificação e qualificação do correntista.
Assim, para que o banco seja responsabilizado, é preciso evidenciar que ele descumpriu seu dever de diligência, como, por exemplo, deixar de seguir procedimentos de segurança ou ao manter relação contratual com evidente risco de fraude.
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem adotado posição cautelosa nesses casos.
No julgamento do REsp 2.124.423, por exemplo, a Corte entendeu que não houve defeito na prestação de serviço de banco digital no caso em que estelionatários usaram uma conta digital para receber pagamentos de vítimas da fraude conhecida como “golpe do leilão falso”.
No caso, o STJ entendeu que, considerando que a instituição cumpriu com o seu dever de verificar e validar a identidade e qualificação dos titulares da conta, não houve defeito no serviço a ensejar a sua responsabilização.
O próprio TJSP, em decisões recentes, reforçou o entendimento de que a instituição financeira não responde automaticamente por fraudes praticadas em marketplaces que utilizam seus sistemas de pagamento, salvo se demonstrada falha concreta na segurança do serviço prestado (nesse sentido, confira-se a Apelação Cível nº 1025350- 95.2022.8.26.0003, 16ª Câmara de Direito Privado, Rel. Des. Mauro Conti Machado).
Assim, a responsabilização de bancos e de instituições financeiras em operações realizadas por meio de marketplaces depende, essencialmente, da análise de elementos fáticos do caso concreto.
Embora a responsabilidade dos bancos seja, em regra, objetiva, ela não se traduz em uma obrigação irrestrita de ressarcimento, sendo necessária a demonstração de que houve efetiva falha na prestação do serviço bancário.