Responsabilidade dos sites intermediadores de comércio eletrônico: análise da recente decisão do STJ sobre a remoção de conteúdo violador dos termos de uso e o Marco Civil da Internet.

O STJ decidiu recentemente que, exceto nas hipóteses previstas pela legislação, os provedores de aplicações de internet não são obrigados a remover conteúdos publicados por terceiros em suas plataformas, mesmo quando há requerimento extrajudicial baseado em violação dos termos de uso. Ao julgar o REsp 2.088.236, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) acatou o recurso […]

O STJ decidiu recentemente que, exceto nas hipóteses previstas pela legislação, os provedores de aplicações de internet não são obrigados a remover conteúdos publicados por terceiros em suas plataformas, mesmo quando há requerimento extrajudicial baseado em violação dos termos de uso.

Ao julgar o REsp 2.088.236, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) acatou o recurso de uma grande plataforma de vendas online para afastar a penalidade imposta pelo Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJ-RJ) em uma ação movida por um dos usuários do site.

No caso dos autos, um anunciante de colchões encaminhou notificações extrajudiciais ao site de intermediação de comércio eletrônico, informando sobre a existência de anúncios de vendedores de colchões magnéticos sem certificação do Inmetro e requerendo, por essa razão, a sua exclusão da plataforma por infringir os termos e condições de uso do site.

A notificação extrajudicial não foi atendida pela plataforma de vendas, levando ao ajuizamento da ação.

De acordo com o STJ, o Marco Civil da Internet (MCI – Lei nº 12.965/2014) enquadra os sites intermediadores de comércio eletrônico, como é o caso do Mercado Livre e da Amazon, na categoria de provedores de aplicações.

Provedores de aplicações são as pessoas, físicas ou jurídicas, que fornecem, na Internet, com objetivos econômicos ou não, funcionalidades e informações produzidas por terceiros, os chamados provedores de informação.

Em outras palavras, provedores de aplicação são aqueles que disponibilizam na internet conteúdos produzidos por terceiros.

Outro esclarecimento importante para a compreensão do assunto diz respeito aos chamados “termos de uso”.

Em seu voto, a relatora do RESP 2.088.236, ministra Nancy Andrighi, explicou que os termos de uso servem para regulamentar a divulgação de anúncios em plataforma de comércio eletrônico. São eles que definem as condições para o uso dos serviços do site, tais como as práticas vedadas e aquelas que são aceitáveis na utilização dos serviços da plataforma.

Como não há, no Marco Civil da Internet, regulamentação sobre as práticas das plataformas de comércio eletrônico quando os termos de uso não são cumpridos, para definir se elas têm obrigação de atender à notificação extrajudicial sobre eventual violação às suas condições, é preciso considerar as disposições da Lei nº 12.965/2024 aplicáveis aos provedores de aplicações.

De acordo com o artigo 19 do MCI o provedor de aplicações de internet somente poderá ser responsabilizado civilmente por danos decorrentes de conteúdo gerado por terceiros se, após ordem judicial específica, não tomar as providências para, no âmbito e nos limites técnicos do seu serviço e dentro do prazo assinalado, tornar indisponível o conteúdo apontado como infringente, ressalvadas as disposições legais em contrário.

Em termos mais simples, se o requerimento para a retirada de anúncio violador dos termos de uso for feito mediante notificação extrajudicial do usuário, o intermediador de comércio eletrônico não está obrigado a obedecê-lo, eis que a lei exige a notificação judicial específica para tanto.

Há, no MCI, apenas duas exceções a essa regra. Isto é, há dois casos em que os sites de intermediação podem ser responsabilizados mesmo sem a existência de notificação judicial específica:

  • A aplicação de informações que violem direitos de autor ou a direitos conexos (art. 19, §2º)
  • A disponibilização de conteúdo que viole a intimidade decorrente da divulgação de imagens, de vídeos ou de outros materiais contendo cenas de nudez ou de atos sexuais de caráter privado, sem a autorização dos participantes (art. 21)

Como é possível perceber, não houve, no caso julgado recentemente pelo STJ, violação aos direitos da personalidade dos usuários da plataforma, mas, tão somente, suposta inobservância dos termos de uso, não podendo, assim, haver a responsabilização do site intermediador pela manutenção dos anúncios na Internet.

A esse respeito, a ministra Nancy Andrighi ponderou que o entendimento da Corte sobre o assunto é no sentido de que a responsabilidade dos provedores é subjetiva e que não é possível impor aos sites intermediadores de comércio eletrônico a obrigação de fazer uma prévia fiscalização sobre a origem de todos os produtos e serviços oferecidos. De acordo com a Corte, esse dever não pode ser exigido por não se tratar de atividade intrínseca ao serviço prestado pelos sites intermediadores[1].

Impor, nessas condições, que a plataforma intermediadora de comércio eletrônico seja obrigada a retirar anúncios que violam os termos de uso, seria exigir-lhes uma fiscalização prévia acerca de tudo o que é disponibilizado na plataforma, o que certamente abriria espaço para abusos por parte dos usuários e, mais do que isso, o que inviabilizaria o próprio funcionamento desses sites de intermediação.

Assim, o intuito do MCI neste ponto é assegurar a liberdade de expressão e impedir a censura indiscriminada e abusiva por parte dos usuários, direitos resguardados pela recente decisão proferida pelo STJ e pelo entendimento que vem sendo perfilhado pela Corte a esse respeito.


[1] No sentido da responsabilidade subjetiva dos sites, confira-se os julgados AgInt no AREsp 685.720/SP e REsp 1.501.603/RN. A respeito da inexigibilidade de controle prévio acerca do conteúdo, confira-se o REsp n. 1.880.344/SP; AgInt no REsp 1.803.362/SP e o REsp 1.193.764/SP.

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