Divergência no STJ sobre a aplicação da Lei do Distrato em compras de terrenos não edificados.

Entendimento das turmas de Direito Privado divide o STJ e reacende o debate sobre o equilíbrio entre proteção ao consumidor e segurança jurídica no mercado imobiliário. A recente divergência entre as turmas de Direito Privado do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reacendeu o debate sobre o regime jurídico aplicável aos contratos de compra e venda […]

Entendimento das turmas de Direito Privado divide o STJ e reacende o debate sobre o equilíbrio entre proteção ao consumidor e segurança jurídica no mercado imobiliário.

A recente divergência entre as turmas de Direito Privado do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reacendeu o debate sobre o regime jurídico aplicável aos contratos de compra e venda de terrenos não edificados quando há desistência por parte do comprador. 

A controvérsia, embora técnica, tem impactos econômicos e sociais significativos, pois define o percentual de retenção, a forma de restituição e a incidência de encargos nos casos de distrato, que é a extinção do contrato por consenso entre as partes.

O conflito envolve contratos firmados após a entrada em vigor da Lei nº 13.786/2018, conhecida como Lei do Distrato Imobiliário e opõe interpretações distintas da 3ª e da 4ª Turmas do STJ.

De um lado, a 3ª Turma entende que, mesmo após a edição da nova lei, quando as relações entre adquirente e loteadora (empresas imobiliárias) forem de consumo, permanecerão regidas pelo Código de Defesa do Consumidor (CDC). Seguindo esse entendimento, se o comprador desiste da aquisição do terreno não edificado, a loteadora pode reter, no máximo, 25% dos valores pagos pelo comprador, com devolução imediata e integral do saldo remanescente. 

Como é possível perceber, trata-se de posição que preserva a lógica protetiva do CDC e o equilíbrio econômico em favor do consumidor, conforme a jurisprudência consolidada pela Corte (Súmula 543, do STJ).

A 4ª Turma, por sua vez, sustenta que a Lei do Distrato, por ser norma específica e posterior, deve prevalecer sobre o CDC, sendo aplicável exclusivamente aos contratos celebrados após sua vigência (REsp 2.104.086/SP). 

De acordo com esse regime jurídico, as loteadoras estão autorizadas a reter até 10% do valor total do contrato, permitindo que o saldo seja restituído em até dez parcelas mensais. Admite-se, ainda, a cobrança de taxa de fruição de 0,75% sobre o valor atualizado do contrato quando o comprador usufruiu do bem. 

Para essa corrente, a aplicação do novo marco legal confere maior previsibilidade e segurança jurídica ao setor, evitando desequilíbrios e incentivando a atividade econômica.

Para facilitar a compreensão do assunto, elaboramos uma tabela comparativa entre os entendimentos da 3ª e da 4ª Turma do STJ sobre o tema:

ASPECTO3ª TURMA4ª TURMA

REGIME JURÍDICO APLICADO

Código de Defesa do Consumidor

Lei do Distrato Imobiliário (Lei nº 13.786/2018) – norma específica posterior
PERCENTUAL DE RETENÇÃOAté 25% dos valores pagosAté 10% do valor total do contrato
FORMA DE DEVOLUÇÃOImediata e integral do saldo remanescenteParcelada em até 10 vezes mensais
TAXA DE FRUIÇÃOInexistente0,75% sobre o valor atualizado, se houver uso do bem
FUNDAMENTO JURÍDICO CENTRALPrimazia da proteção ao consumidor e caráter suplementar da Lei do DistratoPrincípio da especialidade normativa e previsibilidade nas relações imobiliárias
OBJETIVO TUTELADOGarantir liquidez e mitigar as perdas do adquirentePreservar a viabilidade econômica dos empreendimentos e a estabilidade contratual
IMPACTOS PRÁTICOSFavorece o comprador, que recupera rapidamente parte substancial dos valores pagosFavorece a incorporadora/loteadora, que mantém fôlego financeiro e previsibilidade

Conclusão:

As diferenças entre os dois regimes são expressivas e produzem consequências diretas tanto para o comprador quanto para a incorporadora. Enquanto o CDC favorece a liquidez e reduz as perdas do adquirente, a Lei do Distrato assegura maior estabilidade financeira às empresas, prevenindo riscos de descontinuidade nos empreendimentos.

A questão será agora submetida à 2ª Seção do STJ, responsável por uniformizar o entendimento entre as turmas de Direito Privado e a decisão que vier a ser proferida terá efeito vinculante sobre os tribunais inferiores e impacto nacional, sobretudo sobre os contratos de compra e venda de lotes e imóveis firmados após 2018.

Na prática, o que está em jogo é o equilíbrio entre dois valores igualmente relevantes: a proteção ao consumidor e a segurança jurídica das relações contratuais. 

Por conseguinte, o desafio da Corte será encontrar uma solução que preserve a confiança nas transações imobiliárias sem esvaziar a tutela do adquirente, especialmente em um mercado que movimenta grandes volumes de investimento e depende fortemente da previsibilidade normativa.

Diante desse cenário de incerteza jurisprudencial, é recomendável que empresas do setor e adquirentes de imóveis contem com assessoria jurídica especializada para avaliar seus contratos, revisar cláusulas de distrato e adotar medidas preventivas que reduzam potenciais litígios. 

Até que o STJ pacifique o tema, a cautela e a boa técnica contratual permanecem as melhores aliadas da segurança nas relações imobiliárias.

A equipe de especialistas em contratos imobiliários do Alves Benedito Advogados está à disposição para esclarecimentos adicionais sobre o assunto. 

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